sexta-feira, 1 de agosto de 2008

na natureza selvagem

sei que há muitos que não poupam seus louvores às maravilhas da natureza. mas a natureza só é bela quando a contemplamos da segurança do nosso espaço fechado. como deve ser terrível, para aqueles que se encontram no navio que afunda, contemplar o mesmo pôr-do-sol que inspirará os poetas. e, para aqueles que se perderam, a selva nada tem de belo: é o inferno puro. a natureza sem limites, ali a vida e a morte se misturam, e o medo e o ar não podem se separar. o jardim começa quando os homens separam um espaço e dizem: "aqui a natureza será graciosa, um espelho dos meus desejos." numa linguagem do jovem marx, o jardim é a natureza humanizada, que se tornou bom lugar para se morar. extensão do meu corpo, porque cada planta que planto ou cada fonte que construo respondem ao pedido da minha saudade. e é como se neles se repetissem as primeiras lições da criança, junto ao seio materno, que aprende que vida e prazer escorrem de um mesmo lugar. o jardim é a natureza que nos oferece seu corpo como seio, fruto para ser comido, objeto de fruição erótica.
(rubem alves, o quarto do mistério)

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